quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Capítulo 25: “Por mais longe que estejam, os que mais gostamos estão sempre perto do coração”


Rita não reagiu. O seu sorriso desaparecera mas dera lugar a uma indecifrável reacção, nenhuma lágrima rolou pela sua face e nem deu voz a uma única palavra, estava pálida e ficara branca como cal. Aquela (falta de) reacção assustava Fábio, nunca vivera na pele a morte de alguém de quem era próximo e não sabia o que fazer, acabara também de descobrir o sentimento e não conseguia traduzi-lo. Aquele pequeno feto não era da sua família, mas Fábio sentia-se próximo dele, era como um sobrinho que não tinha, como um pequeno irmão que os pais não lhe deram a oportunidade de ter, e aquelas emoções eram indecifráveis... Era uma perda e como sempre lhe disseram as perdas nunca são fáceis de lidar. Mas ia esconder os sentimentos e os pensamentos para poder tranquilizar Rita, ela precisava dele e da sua amizade, mais do que nunca e ele tinha de ser forte por ambos, ele era mais do que nunca, o seu apoio e a sua força. Ele tentando, transmitir forças sem falar, apertou-lhe a mão mas ela não lhe reagiu. Rita nada fazia, estava branca como cal e nada mais poderia fazer Fábio além de esperar.
Luís, sem energias caiu no chão e assim ficou chorando compulsivamente, ele acabara de perder um filho. Um filho que apesar de ainda estar no ventre da mãe não deixaria de ser o seu pequeno bebé, aquele bebé era a esperança da família Madeira, era ele que tinha unido os pais e tal como um anjo depois de fazer o seu objectivo predominante na Terra, aceitou o seu destino tranquilamente e foi para o céu. Ana tentava fazer com que o pai controlasse as suas lágrimas mas ela própria sabia que depois de os deixar iria chorar aquela perda, nunca reagira bem a mortes e daquela vez tentava como sempre, e como reagira Rita, ser forte. O cunhado, Miguel tentava juntamente com a esposa, Diana oferecer apoio ao sogro mas sabiam que por muitas palavras que dissessem nunca iriam ajudar o suficiente para ele parar de chorar, apenas com o tempo iria aceitar a perda do filho.

Fábio sentiu a sua mão a ficar apertada, Rita começava a reagir, olhou para ela e a sua respiração estava descontrolada, sentiu-se preocupado e falou com ela tentando entender o que se passava ao certo para poder ajudá-la:

-Pequena, que tens? – Ela nada respondera, parecia que a respiração estava a escassear e ele pegou nela ao colo e levou para o exterior do hospital. Pousou-a no chão e com as mãos tentou dar-lhe ar, talvez assim ela recuperasse, passado alguns minutos a respiração acalmou e ele conseguiu perguntar. –Estás melhor Rita?

Rita abanou positivamente a cabeça, mas no fundo sentia-se sufocar com aquela notícia. Por sua culpa tinha perdido o irmão. A mãe tinha-lhe oferecido boleia até à escola e ela recusara. Se tivesse aceite, a mãe atrasar-se-ia a sair de casa e o acidente não teria ocorrido. Sentia-se culpada e essa dor feri-a mais do que a dor de perder o irmão. Fábio apertou-lhe a mão e ela retribuiu, e pela primeira vez olhou-o nos olhos... Ele assustou-se, os seus olhos estavam secos e demonstravam uma expressão assustadora, parecia que o brilho que existia sempre no olhar dela desaparecera, que a sua alegria tivesse desaparecido com a notícia e ele sentia-se impotente por não saber o que fazer, amava-a mas tinha medo de não ter a atitude adequada para ela, que as suas atitudes não demonstrassem o que realmente sentia por ela e que não fosse a pessoa que ela precisasse neste momento tão difícil.

-Fábio, posso pedir-te um favor? – Disse Rúben aproximando-se deles.

-Sim, claro diga-me. – Perguntou Fábio sem nunca afastar a sua mão da de Rita, tentando tranquilizá-la com aquele pequeno gesto.

-Estive a falar com a Ana e com o senhor Luís e este ambiente não faz nada bem à Ritinha... E além do mais não iria ficar cá a fazer nada. Não te importes de a levares a passear para arejar? – Fábio olhou para Rita como que perguntando a sua opinião, ela não respondera com nenhum gesto apenas olhou para ele e conseguiu decidir através daquela pequena troca de olhares.

-Claro que não, talvez assim também a ajude a reagir..

-Obrigado. Em meu nome e em nome desta família, obrigado por estares aqui e pelo que tens vindo a fazer e estás a fazer pela nossa pequena.

-Obrigado eu por me terem dado a sorte de conhecer a Ritinha e por ter-vos a todos, sem excepção, na minha vida.
Fábio agarrou na cintura de Rita e fê-la levantar-se do chão onde estava sentada, ela levantou-se a muito custo e seguiram até ao carro dele. Ele colocou-lhe o cinto e de seguida sentou-se no volante, mas antes disse:

-Não é fácil para ti e acredita quando te digo que também não o é para mim, mas se o teu irmão sobrevivesse, provavelmente tanto ele como a tua mãe estariam em sofrimento e assim estão ambos em paz, sei que custa ouvir mas talvez assim seja o melhor para ambos.

-Não sei lidar com este sentimento... – Pela primeira vez desde que souberam a notícia, Fábio conseguira ver uma reação em Rita. –É o sentimento de impotência, de culpa, o sentimento de perda e de revolta. É o meu irmão... Não posso simplesmente perdê-lo como do dia para a noite. – Escondeu a cara com as mãos.

-Ritinha. – Colocou a mão sobre a saia dela. – Sabes qual é a melhor cura para as tristezas? Baldes de gelado, pacotes de gomas e bolos, muitos, muitos bolos!

Rita sorriu e foi quanto bastou para ele ligar o carro e começar a seguir o seu caminho mas em vez de seguir o seu caminho para casa, fez um pequeno desvio, o que foi o suficiente para ela perguntar:

-Vamos onde pequeno?

-Sou enorme fica sabendo? – Disse sorrindo. –Um jogador da bola não pode ter tantas porcarias dessas em casa, vamos ás compras!

-Até parece que não tens vários tipos de gomas em casa.

-Eu compro vários pacotes e estilos de gomas mas elas durarem lá em casa sabes que não é verdade.
Fábio estacionou o carro na garagem daquele centro comercial e saíram do interior do carro e ele aproximou-se dela e cruzaram os seus dedos e começaram a percorrer o caminho até ao supermercado.

-Olá Fábio, à quanto tempo não te via! Que andas a fazer tão bem acompanhado? – Perguntou um rapaz com quem se cruzaram no corredor daquele centro comercial.

-Olá Daniel, não tenho andado muito por aqui, tenho mais ficado em casa com a minha namorada. Rita é o Daniel, Daniel é a Rita.

-Boa tarde. – Cumprimentou Rita afastando os potenciais dois beijos que Daniel queria trocar.

-Estão juntos há muito tempo?

-Sim, há algum.

-Então têm passado muito tempo em casa, vê lá se não tens algum percalço...

-Daniel, podes estar descansado que se acontecer alguma coisa não te irei pedir nada. – Respondeu Fábio, enquanto Rita sentia-se incomodada com a presença daquele rapaz e com as perguntas feias que ele fazia, acabaram por se despedir e continuar o seu percurso. –Desculpa Rita, não queria que conhecesses este tipo de pessoas, que já considerei amigos. Eu era uma pessoa diferente, e tudo o que eu era mudou, desde que te conheci que sou diferente.

-Eu não fiz com que tu mudasses, tu é que o quiseste fazer. – Respondeu serena. –Tu arranjaste em mim mais que uma amiga, arranjaste em mim um amor.

-E quero estar contigo para sempre, sou feliz contigo a meu lado e acho que não conseguiria já viver sem ti.

-Claro que conseguirias, tu viveste sem mim dezanove anos, conseguirias viver ainda mais.

-Eu sobrevivi sem ti, viver só aprendi a teu lado.
Pela primeira vez, Rita olhou para ele e tomou coragem para o beijar, estava apaixonada e já não haveria dúvidas, mas não conseguia iniciar uma relação com ele, tinha medo que Fábio se deixasse “encantar” por outra rapariga, ainda estava magoada com o que Tiago lhe tinha feito, precisava de tempo para o conseguir dizer, mas iria fazê-lo, eles sabiam.
Foram até ao supermercado e compraram os mais variados doces, vários pacotes de gomas, de pipocas e de bolos e foram até à caixa, e o primeiro olhar que a rapariga da caixa fez a Fábio incomodou-a bastante e olhou-a de volta.

-Olá Fábio. – Disse a rapariga.

-Olá Filipa. – Respondeu ele, enquanto Rita o olhava.

-Como estás?

-Estou bem, obrigada. – Respondeu de forma seca.

-Também estou bem, obrigada. – Disse apesar dele não ter devolvido a preocupação. –Eu liguei-te e mandei mensagem e tu nem respondeste, desapareceste.

-Talvez porque não queria que me incomodasses. – Rita olhou para ele surpreendida com a forma com que ele falara.

-Credo Fábio, tu não eras assim! Fiz-te alguma coisa?

-Filipa esquece tudo o que se passou, eu fiz o mesmo. – Deu-lhe algum dinheiro e virou costas e foi embora. –Podes ficar com o troco.

-O que se passou entre ti e esta rapariga? Vocês já se tinham envolvido não já?

-Sim, curtimos à uns meses mas eu acabei tudo mas pelos vistos ela não percebeu.

-E porque não o quiseste fazer?

-Estou bem e feliz contigo, meu bem. É a ti que te amo. – Deu-lhe um beijo na testa e continuaram o caminho de mãos dadas.
Quando chegaram a casa Rita já tinha aberto um pacote de gomas e tinha partilhado com Fábio e já o tinham acabado, decidiram que o melhor era irem até casa dele e sentaram-se em cima da cama rodeados de todas as guloseimas que haviam comprado. Fábio abriu as pernas e Rita sentou-se entre elas e pousou a cabeça e a mão direita sobre o seu peito.

-Ritinha. – Ela ergueu a cabeça e olhou para ele. –Sei que amavas este pequeno bebé como amas o Pedrito e a Ana e que esta perda te abalou muito e gostava de saber o que te dizer, mas não imagino qual é a dor de perder alguém que amamos e por isso não sei, e imagino que não haja palavras que te façam animar ou que te possam ajudar a ultrapassar. Tu és forte, muito forte, mais do que pensas e já ultrapassaste muitas dificuldades e com sucesso, e não quero que te chateias com o que vou dizer mas que tentes compreender. Não quero que te sintas culpada pelo que aconteceu, porque nunca o serias, se existe um culpado sou eu. – Rita queria interrompê-lo para o defender mas entendeu que existia uma explicação para o que ele dizia. –Talvez o teu irmão pequenito fosse um anjo da guarda que tinha apenas como objectivo vir à Terra para reunir novamente a família Madeira e depois de cumprir a sua missão acabou por partir, ele está em paz neste momento. Se ele tivesse ficado aqui, provavelmente estaria em sofrimento assim como a tua mãe, e mesmo na hora da morte foi caridoso, porque para a tua mãe não ficar em sofrimento decidiu partir e ficarem ambos bem. Por mais longe que ele esteja, os que mais gostamos estão sempre perto do coração, como me ensinou e bem a minha mãe e é com esse ensinamento que quero que penses. O Bernas ou a Clarinha estão agora a olhar por vocês no céu e vai sempre torcer por vocês e a ajudar todos os que gostam dele lá do céu. – Rita chorava imenso ouvindo as palavras que Fábio dissera, talvez ele tivesse razão e tinha de aceitar, em paz, aquelas palavras e encarar a realidade. Se o irmão tivesse sobrevivido, tanto ele como a mãe estariam em sofrimento e assim estariam ambos em paz.

-Nem tenho palavras para te agradecer... – Hesitou. –Tu nunca passaste a dor de perder alguém que amas mas soubeste exactamente as palavras certas para me dizer, para tranquilizares o meu coração. Além de seres o meu amor, és o meu melhor amigo. – Deu-lhe um abraço apertado. -Sei que a mim me magoa e vai magoar sempre um bocadinho, mas ao Pedrito vai custar imenso. Ele já estava a pensar partilhar o quarto com ele, jogarem futebol, ele tinha os planos todos pensados e agora não vai poder cumpri-los, porque o irmão simplesmente agora é um anjo.

-Nos próximos tempos, tu e a tua irmã vão assumir um papel ainda mais importante na vida do Pedrito, porque os teus pais vão precisar de aceitar tudo, mas vocês não estão sozinhas, têm a mim e ao Rúben.

-Adoro-te! – Abraçou-o com força. –Obrigada por estares aqui e por estares na minha vida. – Aconchegou-se no peito dele e permaneceram em silêncio durante uns segundos. –Sei que ás vezes não demonstro o quanto gosto de ti, mas eu adoro-te. Do fundo do meu coração. Só que eu ainda me sinto insegura. O Tiago magoou-me muito, ele desiludiu-me e destruiu-me o coração e tu ajudaste-me a recuperar, é verdade, mas só com o tempo vou perdoar o que ele fez e aceitar. Só te peço para me dares tempo, por favor. – Fábio beijou-a na testa.

-Ritinha, meu bem, eu vou dar-te todo o tempo que quiseres e precisares. O que o Tiago te fez foi mau demais mas o mal que ele te fez, eu vou-te dar em duplicado, porque o que sinto por ti é mais que uma amizade, é um amor. Eu amo-te. – Ela sorriu e beijou-o, apesar dela não dizer que o sentimento era recíproco ele sentiu-o e isso era o mais importante. Encostou a cabeça no peito dele e adormeceram pouco depois. Tinha sido um dia cansativo e cheio de emoções e ainda tinham de arranjar forças para dar a notícia ao pequeno Pedrito e precisavam das palavras certas para lho dizer.

(Passado algumas horas)
Rita acordou com o som da campainha a tocar, queria acordar Fábio afinal a casa também era dele mas o instinto fê-la acordar e ir abrir a porta. Espreitou pelo buraco da porta e era uma senhora. Não a reconhecia mas também não lhe causou ciúmes. Era uma senhora de meia idade, talvez uma tia dele, não sabia. Hesitou, talvez devesse ir acordar Fábio e ele abrisse a porta mas até então ela iria embora. Abriu a porta e cumprimentou com as boas-vindas.

-Boa tarde. – Disse claramente envergonhada.

-Boa tarde querida. Posso entrar?

-A casa não é minha... E o Fábio está a dormir. Pode-me dizer quem é?

-Teresa Antunes, mãe do Fábio. – Rita, não sorrira naquele dia e depois de ouvir as palavras “mãe do Fábio” gelou, tinha conhecido a mãe do seu melhor amigo e do seu futuro namorado e não sabia o que fazer.

Como se irá desenrascar Rita?
Como correrá o encontro com a mãe de Fábio? E como irão contar a notícia a Pedrito?

2 comentários:

  1. Hello :)
    Que capitulo tristinho :'(
    Mas o Fábiuo tem razão naquilo que disse :)
    Shé!...que alta barraca...conhecer a "sogra" sem planear :P
    Espero que a Rita se desenrasque desta embrulhada :P
    Espero que o encontro entre "sogra e nora" corra bem ;)
    Como irão contar ao caçula?...aí que eu não sei, mas tem que contar :/
    Próximo bjs

    ResponderEliminar
  2. Olá!
    Bem, agradou me a forma "poética" como este aborto foi encarado. Ok, esta frase não expressou minimamente o que eu queria dizer.
    O que quis dizer é que achei bonito terem considerado este bebé como um pequeno anjo que veio cumprir a missão de unir esta família para depois partir.
    E uma pessoa já não pode ir ao shopping sem encontrar tudo o que deixou para trás?? E pelos vistos não deixou nada de bom. Que raio de companhias, Fabinho!
    E agora sogrinha à porta? Bem, o Fábio e a Rita são especialistas em safar se deste tipo de situações portanto tenho fé que desta vez não seja diferente xD
    Espero o próximo!

    Beso
    Ana Santos

    ResponderEliminar