Rita
não reagiu. O seu sorriso desaparecera mas dera lugar a uma
indecifrável reacção, nenhuma lágrima rolou pela sua face e nem
deu voz a uma única palavra, estava pálida e ficara branca como
cal. Aquela (falta de) reacção assustava Fábio, nunca vivera na
pele a morte de alguém de quem era próximo e não sabia o que
fazer, acabara também de descobrir o sentimento e não conseguia
traduzi-lo. Aquele pequeno feto não era da sua família, mas Fábio
sentia-se próximo dele, era como um sobrinho que não tinha, como um
pequeno irmão que os pais não lhe deram a oportunidade de ter, e
aquelas emoções eram indecifráveis... Era uma perda e como sempre
lhe disseram as perdas nunca são fáceis de lidar. Mas ia esconder
os sentimentos e os pensamentos para poder tranquilizar Rita, ela
precisava dele e da sua amizade, mais do que nunca e ele tinha de ser
forte por ambos, ele era mais do que nunca, o seu apoio e a sua
força. Ele tentando, transmitir forças sem falar, apertou-lhe a mão
mas ela não lhe reagiu. Rita nada fazia, estava branca como cal e
nada mais poderia fazer Fábio além de esperar.
Luís,
sem energias caiu no chão e assim ficou chorando compulsivamente,
ele acabara de perder um filho. Um filho que apesar de ainda estar no
ventre da mãe não deixaria de ser o seu pequeno bebé, aquele bebé
era a esperança da família Madeira, era ele que tinha unido os pais
e tal como um anjo depois de fazer o seu objectivo predominante na
Terra, aceitou o seu destino tranquilamente e foi para o céu. Ana
tentava fazer com que o pai controlasse as suas lágrimas mas ela
própria sabia que depois de os deixar iria chorar aquela perda,
nunca reagira bem a mortes e daquela vez tentava como sempre, e como
reagira Rita, ser forte. O cunhado, Miguel tentava juntamente com a
esposa, Diana oferecer apoio ao sogro mas sabiam que por muitas
palavras que dissessem nunca iriam ajudar o suficiente para ele parar
de chorar, apenas com o tempo iria aceitar a perda do filho.
Fábio
sentiu a sua mão a ficar apertada, Rita começava a reagir, olhou
para ela e a sua respiração estava descontrolada, sentiu-se
preocupado e falou com ela tentando entender o que se passava ao
certo para poder ajudá-la:
-Pequena,
que tens? –
Ela nada respondera, parecia que a respiração estava a escassear e
ele pegou nela ao colo e levou para o exterior do hospital. Pousou-a
no chão e com as mãos tentou dar-lhe ar, talvez assim ela
recuperasse, passado alguns minutos a respiração acalmou e ele
conseguiu perguntar. –Estás
melhor Rita?
Rita
abanou positivamente a cabeça, mas no fundo sentia-se sufocar com
aquela notícia. Por sua culpa tinha perdido o irmão. A mãe
tinha-lhe oferecido boleia até à escola e ela recusara. Se tivesse
aceite, a mãe atrasar-se-ia a sair de casa e o acidente não teria
ocorrido. Sentia-se culpada e essa dor feri-a mais do que a dor de
perder o irmão. Fábio apertou-lhe a mão e ela retribuiu, e pela
primeira vez olhou-o nos olhos... Ele assustou-se, os seus olhos
estavam secos e demonstravam uma expressão assustadora, parecia que
o brilho que existia sempre no olhar dela desaparecera, que a sua
alegria tivesse desaparecido com a notícia e ele sentia-se impotente
por não saber o que fazer, amava-a mas tinha medo de não ter a
atitude adequada para ela, que as suas atitudes não demonstrassem o
que realmente sentia por ela e que não fosse a pessoa que ela
precisasse neste momento tão difícil.
-Fábio,
posso pedir-te um favor? –
Disse Rúben aproximando-se deles.
-Sim, claro diga-me. –
Perguntou Fábio sem nunca afastar a sua mão da de Rita, tentando
tranquilizá-la com aquele pequeno gesto.
-Estive
a falar com a Ana e com o senhor Luís e este ambiente não faz nada
bem à Ritinha... E além do mais não iria ficar cá a fazer nada.
Não te importes de a levares a passear para arejar? –
Fábio olhou para Rita como que perguntando a sua opinião, ela não
respondera com nenhum gesto apenas olhou para ele e conseguiu decidir
através daquela pequena troca de olhares.
-Claro
que não, talvez assim também a ajude a reagir..
-Obrigado.
Em meu nome e em nome desta família, obrigado por estares aqui e
pelo que tens vindo a fazer e estás a fazer pela nossa pequena.
-Obrigado
eu por me terem dado a sorte de conhecer a Ritinha e por ter-vos a
todos, sem excepção, na minha vida.
Fábio
agarrou na cintura de Rita e fê-la levantar-se do chão onde estava
sentada, ela levantou-se a muito custo e seguiram até ao carro dele.
Ele colocou-lhe o cinto e de seguida sentou-se no volante, mas antes
disse:
-Não
é fácil para ti e acredita quando te digo que também não o é
para mim, mas se o teu irmão sobrevivesse, provavelmente tanto ele
como a tua mãe estariam em sofrimento e assim estão ambos em paz,
sei que custa ouvir mas talvez assim seja o melhor para ambos.
-Não
sei lidar com este sentimento... –
Pela primeira vez desde que souberam a notícia, Fábio conseguira
ver uma reação em Rita. –É
o sentimento de impotência, de culpa, o sentimento de perda e de
revolta. É o meu irmão... Não posso simplesmente perdê-lo como do
dia para a noite. –
Escondeu a cara com as mãos.
-Ritinha.
–
Colocou a mão sobre a saia dela. –
Sabes qual é a melhor cura para as tristezas? Baldes de gelado,
pacotes de gomas e bolos, muitos, muitos bolos!
Rita
sorriu e foi quanto bastou para ele ligar o carro e começar a seguir
o seu caminho mas em vez de seguir o seu caminho para casa, fez um
pequeno desvio, o que foi o suficiente para ela perguntar:
-Vamos
onde pequeno?
-Sou
enorme fica sabendo? –
Disse sorrindo. –Um
jogador da bola não pode ter tantas porcarias dessas em casa, vamos
ás compras!
-Até
parece que não tens vários tipos de gomas em casa.
-Eu
compro vários pacotes e estilos de gomas mas elas durarem lá em
casa sabes que não é verdade.
Fábio
estacionou o carro na garagem daquele centro comercial e saíram do
interior do carro e ele aproximou-se dela e cruzaram os seus dedos e
começaram a percorrer o caminho até ao supermercado.
-Olá
Fábio, à quanto tempo não te via! Que andas a fazer tão bem
acompanhado? –
Perguntou um rapaz com quem se cruzaram no corredor daquele centro
comercial.
-Olá
Daniel, não tenho andado muito por aqui, tenho mais ficado em casa
com a minha namorada. Rita é o Daniel, Daniel é a Rita.
-Boa
tarde. –
Cumprimentou Rita afastando os potenciais dois beijos que Daniel
queria trocar.
-Estão
juntos há muito tempo?
-Sim,
há algum.
-Então
têm passado muito tempo em casa, vê lá se não tens algum percalço...
-Daniel,
podes estar descansado que se acontecer alguma coisa não te irei
pedir nada. –
Respondeu Fábio, enquanto Rita sentia-se incomodada com a presença
daquele rapaz e com as perguntas feias que ele fazia, acabaram por se
despedir e continuar o seu percurso. –Desculpa
Rita, não queria que conhecesses este tipo de pessoas, que já
considerei amigos. Eu era uma pessoa diferente, e tudo o que eu era
mudou, desde que te conheci que sou diferente.
-Eu
não fiz com que tu mudasses, tu é que o quiseste fazer. –
Respondeu serena. –Tu
arranjaste em mim mais que uma amiga, arranjaste em mim um amor.
-E
quero estar contigo para sempre, sou feliz contigo a meu lado e acho
que não conseguiria já viver sem ti.
-Claro
que conseguirias, tu viveste sem mim dezanove anos, conseguirias
viver ainda mais.
-Eu
sobrevivi sem ti, viver só aprendi a teu lado.
Pela
primeira vez, Rita olhou para ele e tomou coragem para o beijar,
estava apaixonada e já não haveria dúvidas, mas não conseguia
iniciar uma relação com ele, tinha medo que Fábio se deixasse
“encantar” por outra rapariga, ainda estava magoada com o que
Tiago lhe tinha feito, precisava de tempo para o conseguir dizer, mas
iria fazê-lo, eles sabiam.
Foram
até ao supermercado e compraram os mais variados doces, vários
pacotes de gomas, de pipocas e de bolos e foram até à caixa, e o
primeiro olhar que a rapariga da caixa fez a Fábio incomodou-a
bastante e olhou-a de volta.
-Olá
Fábio. –
Disse a rapariga.
-Olá
Filipa. –
Respondeu ele, enquanto Rita o olhava.
-Como
estás?
-Estou
bem, obrigada. –
Respondeu de forma seca.
-Também
estou bem, obrigada. –
Disse apesar dele não ter devolvido a preocupação. –Eu
liguei-te e mandei mensagem e tu nem respondeste, desapareceste.
-Talvez
porque não queria que me incomodasses. –
Rita olhou para ele surpreendida com a forma com que ele falara.
-Credo
Fábio, tu não eras assim! Fiz-te alguma coisa?
-Filipa
esquece tudo o que se passou, eu fiz o mesmo. –
Deu-lhe algum dinheiro e virou costas e foi embora. –Podes
ficar com o troco.
-O
que se passou entre ti e esta rapariga? Vocês já se tinham
envolvido não já?
-Sim,
curtimos à uns meses mas eu acabei tudo mas pelos vistos ela não
percebeu.
-E
porque não o quiseste fazer?
-Estou
bem e feliz contigo, meu bem. É a ti que te amo. –
Deu-lhe um beijo na testa e continuaram o caminho de mãos dadas.
Quando
chegaram a casa Rita já tinha aberto um pacote de gomas e tinha
partilhado com Fábio e já o tinham acabado, decidiram que o melhor
era irem até casa dele e sentaram-se em cima da cama rodeados de
todas as guloseimas que haviam comprado. Fábio abriu as pernas e
Rita sentou-se entre elas e pousou a cabeça e a mão direita sobre o
seu peito.
-Ritinha.
– Ela
ergueu a cabeça e olhou para ele. –Sei
que amavas este pequeno bebé como amas o Pedrito e a Ana e que esta
perda te abalou muito e gostava de saber o que te dizer, mas não
imagino qual é a dor de perder alguém que amamos e por isso não
sei, e imagino que não haja palavras que te façam animar ou que te
possam ajudar a ultrapassar. Tu és forte, muito forte, mais do que
pensas e já ultrapassaste muitas dificuldades e com sucesso, e não
quero que te chateias com o que vou dizer mas que tentes compreender.
Não quero que te sintas culpada pelo que aconteceu, porque nunca o
serias, se existe um culpado sou eu. –
Rita queria interrompê-lo para o defender mas entendeu que existia
uma explicação para o que ele dizia. –Talvez
o teu irmão pequenito fosse um anjo da guarda que tinha apenas como objectivo vir à Terra para reunir novamente a família Madeira e
depois de cumprir a sua missão acabou por partir, ele está em paz
neste momento. Se ele tivesse ficado aqui, provavelmente estaria em
sofrimento assim como a tua mãe, e mesmo na hora da morte foi
caridoso, porque para a tua mãe não ficar em sofrimento decidiu
partir e ficarem ambos bem. Por mais longe que ele esteja, os que
mais gostamos estão sempre perto do coração, como me ensinou e bem
a minha mãe e é com esse ensinamento que quero que penses. O Bernas
ou a Clarinha estão agora a olhar por vocês no céu e vai sempre
torcer por vocês e a ajudar todos os que gostam dele lá do céu. –
Rita chorava imenso ouvindo as palavras que Fábio dissera, talvez
ele tivesse razão e tinha de aceitar, em paz, aquelas palavras e
encarar a realidade. Se o irmão tivesse sobrevivido, tanto ele como
a mãe estariam em sofrimento e assim estariam ambos em paz.
-Nem
tenho palavras para te agradecer... –
Hesitou. –Tu
nunca passaste a dor de perder alguém que amas mas soubeste
exactamente as palavras certas para me dizer, para tranquilizares o
meu coração. Além de seres o meu amor, és o meu melhor amigo. –
Deu-lhe um abraço apertado. -Sei
que a mim me magoa e vai magoar sempre um bocadinho, mas ao Pedrito
vai custar imenso. Ele já estava a pensar partilhar o quarto com
ele, jogarem futebol, ele tinha os planos todos pensados e agora não
vai poder cumpri-los, porque o irmão simplesmente agora é um anjo.
-Nos
próximos tempos, tu e a tua irmã vão assumir um papel ainda mais
importante na vida do Pedrito, porque os teus pais vão precisar de
aceitar tudo, mas vocês não estão sozinhas, têm a mim e ao Rúben.
-Adoro-te!
–
Abraçou-o com força. –Obrigada
por estares aqui e por estares na minha vida. –
Aconchegou-se no peito dele e permaneceram em silêncio durante uns
segundos. –Sei
que ás vezes não demonstro o quanto gosto de ti, mas eu adoro-te.
Do fundo do meu coração. Só que eu ainda me sinto insegura. O
Tiago magoou-me muito, ele desiludiu-me e destruiu-me o coração e
tu ajudaste-me a recuperar, é verdade, mas só com o tempo vou
perdoar o que ele fez e aceitar. Só te peço para me dares tempo,
por favor. –
Fábio beijou-a na testa.
-Ritinha,
meu bem, eu vou dar-te todo o tempo que quiseres e precisares. O que
o Tiago te fez foi mau demais mas o mal que ele te fez, eu vou-te dar
em duplicado, porque o que sinto por ti é mais que uma amizade, é
um amor. Eu amo-te. –
Ela sorriu e beijou-o, apesar dela não dizer que o sentimento era
recíproco ele sentiu-o e isso era o mais importante. Encostou a
cabeça no peito dele e adormeceram pouco depois. Tinha sido um dia
cansativo e cheio de emoções e ainda tinham de arranjar forças
para dar a notícia ao pequeno Pedrito e precisavam das palavras
certas para lho dizer.
(Passado
algumas horas)
Rita
acordou com o som da campainha a tocar, queria acordar Fábio afinal
a casa também era dele mas o instinto fê-la acordar e ir abrir a
porta. Espreitou pelo buraco da porta e era uma senhora. Não a
reconhecia mas também não lhe causou ciúmes. Era uma senhora de
meia idade, talvez uma tia dele, não sabia. Hesitou, talvez devesse
ir acordar Fábio e ele abrisse a porta mas até então ela iria
embora. Abriu a porta e cumprimentou com as boas-vindas.
-Boa
tarde. –
Disse claramente envergonhada.
-Boa
tarde querida. Posso entrar?
-A
casa não é minha... E o Fábio está a dormir. Pode-me dizer quem
é?
-Teresa
Antunes, mãe do Fábio. –
Rita, não sorrira naquele dia e depois de ouvir as palavras “mãe
do Fábio” gelou, tinha conhecido a mãe do seu melhor amigo e do
seu futuro namorado e não sabia o que fazer.
Como
se irá desenrascar Rita?
Como
correrá o encontro com a mãe de Fábio? E como irão contar a
notícia a Pedrito?
Hello :)
ResponderEliminarQue capitulo tristinho :'(
Mas o Fábiuo tem razão naquilo que disse :)
Shé!...que alta barraca...conhecer a "sogra" sem planear :P
Espero que a Rita se desenrasque desta embrulhada :P
Espero que o encontro entre "sogra e nora" corra bem ;)
Como irão contar ao caçula?...aí que eu não sei, mas tem que contar :/
Próximo bjs
Olá!
ResponderEliminarBem, agradou me a forma "poética" como este aborto foi encarado. Ok, esta frase não expressou minimamente o que eu queria dizer.
O que quis dizer é que achei bonito terem considerado este bebé como um pequeno anjo que veio cumprir a missão de unir esta família para depois partir.
E uma pessoa já não pode ir ao shopping sem encontrar tudo o que deixou para trás?? E pelos vistos não deixou nada de bom. Que raio de companhias, Fabinho!
E agora sogrinha à porta? Bem, o Fábio e a Rita são especialistas em safar se deste tipo de situações portanto tenho fé que desta vez não seja diferente xD
Espero o próximo!
Beso
Ana Santos