Rita abriu a porta e levantou-se. Pousou o pé direito no chão e não conseguia fazer pressão, por isso colocou o pé esquerdo e deixou-se coxear, para afastar-se do amigo. Tentara ser forte e demonstrar que estava tudo bem mas aquelas palavras que ouvira, pareciam ter sido como uma facada aplicada no seu coração e quando ela menos esperava. O rapaz saiu do carro e bastou alguns passos para chegar até perto da amiga.
-Onde vais? – Perguntou continuando atrás dela, sem
nunca a ultrapassar ou impedir de continuar a “saltitar”.
-Vou para casa ou para um sítio qualquer. Eu cá me
desenrasco.
-E achas que a essa velocidade chegas lá hoje?
-Não quero saber! O que importa é chegar! – Fábio
agarrou no braço esquerdo de Rita e colocou-se á sua frente.
-Mas tu importaste de me explicar o porquê desta tua
atitude repentina? – Perguntou sem compreender o gesto da
amiga.
-Pensava que eras mais inteligente que isso Fábio.
Ainda não compreendeste o que fizeste? – O rapaz não estava a compreender as
atitudes da amiga mas queria saber.
-Volta para aquele carro para falarmos, que estares aqui
com o teu pé assim, só faz mal.
-Não vou contigo para lado nenhum. Vai ter com a tua
amiguinha e deixa-me em paz! – Não estava nada á espera daquela
atitude e por isso Fábio largou o braço dela que começou a afastar-se dele. Mas, bastaram alguns segundos
para chegar a uma breve conclusão. Deu dois grandes passos e alcançou-a.
-Tu estás com ciúmes? – Perguntou
sorrindo, olhando-a olhos nos olhos.
-Claro é isso mesmo! Tu até és a última bolacha do
pacote!
-Tu estás com ciúmes. – Sorriu. – Mas
não significa que só por estar numa relação que vou deixar de ser teu amigo.
-Não alcanças mesmo. – Contornou o amigo aos saltinhos. Mas
ele não se deixava vencer. Ultrapassou-a e colocou-se á sua frente.
-Então explica-me como se fosse muito idiota senão te
importas! – A jovem natural de Lisboa, colocou a mão sobre o braço dele de
forma a conseguir aguentar-se em pé.
-Afastei-me de uma amigo que conheço há 7 anos, porque
optei por ti em vez dele. Pensei que estávamos concentrados um no outro, apenas isso. Que estava a mudar a tua forma
de pensar. Que te estava a demonstrar que as curtes não levam a lado nenhum e
que um amor dá-te mais felicidade que todas essas relações juntas. E tu, pura e
simplesmente, dás a entender com palavras que sabes e entendeste e fazes o
oposto. E sinceramente, chateia-me que não tenhas entendido isso. – Disse
calmamente tentando explicar tudo o que sentia.
-E o que achas que senti quando te vi aos beijos com o
Pedro? Não é ciúmes, apenas não te consigo ver com outra pessoa, tenho medo que
te voltem a magoar e a desiludir. E em muitos momentos, sou eu que tenho medo
de te magoar, mesmo que sem querer. Não duvides que aprendi muito contigo, mas
também me magoou a tua relação com o Pedro. Parecia que, tal como disseste,
dizias uma coisa, e fazias outra. E o principal motivo para estar com a
Catarina é o facto de tu estares com o Pedro. Mas fiz questão de deixar tudo
bem claro. Ela gosta mesmo de mim e eu não a quero magoar.
-Tu também tiveste ciúmes quando me viste com o Pedro. – Disse sorrindo. -E
se queres a verdade, também não gostei de saber que estavas com a Catarina. Porque
não suportamos a ideia de partilhar a atenção com outro pessoa. Estamos aqui um
para o outro. E nós somos felizes juntos, enquanto amigos. – Os olhos de ambos brilhavam como duas
estrelas. Duas estrelas que pareciam ligadas por faíscas, mas também por algo
mais. – Tu és maior e vacinado, sabes o que fazes, mas não vou esconder aquilo
que penso. Não te peço para acabares, mas acho que senão gostas dessa rapariga,
vais ser infeliz só para a fazeres feliz e no final, só a vais magoar mais. – Os olhares entre ambos eram constantes
e brilhavam, davam a entender que precisavam daquilo para sobreviver, não se
conseguiam separar, mesmo se tentassem. E simplesmente não conseguiam pensar em
nada mais. Parecia que eles eram o centro do universo. Ninguém queria falar,
mas sentiam que tinham de o fazer. Mas o quê?
A distância entre ambos era
de alguns centímetros mas pareciam quilómetros, pelo menos sentiam como tal.
Rita tocara no braço de Fábio e sentia os músculos do braço dele que se atreveu-se
a esticar os braços e deixá-los sobre o fundo das costas dela, que não negou.
Sorriu envergonhada enquanto os olhares continuavam cravados um no outro. Rita ergueu
as mãos e pousou-as sobre os ombros do amigo enquanto os olhares continuavam
cravados um no outro, mas, desta vez mais próximos. Os corpos tocavam-se. A
diferença de alturas era significativa, Rita tinha de erguer a cabeça para
poder observar a face de Fábio e ele tinha de baixar a cabeça para poder observá-la.
Podiam não conhecer todos os traços do outro, mas os olhares conheciam como se desde
outra vida, se conhecessem. O perfume de Fábio começava a entranhar-se nela e o
seu toque deixara-a arrepiada, gostava tanto que a deixava arrepiada. Aquele
sentimento que nutriam um pelo outro ainda não era um amor, mas também não era
uma amizade. Aproximaram-se ainda mais um do outro fazendo com que o seu peito
embate-se no peito dele. E para Fábio por muito que gostasse do corpo da
mulher, com ela, era diferente. Sentia apenas a necessidade de tomar conta dela,
e de serem felizes um ao lado do outro.
Ela sabia o que antecipara
aquele momento, já o tinha passado anteriormente. E ele também sabia. Ambos sabiam qual era o
caminho que aquele momento podia originar. E apenas conseguiam concentrar-se
nos olhares um do outro.
Não afastaram o olhar um
do outro, nem por um milésimo de segundo. Rita abriu a boca, deixando o seu
hálito chegar até aos lábios de Fábio. Que imitou o gesto da amiga, e as faces
continuavam a aproximar-se e os centímetros tornavam-se milímetros. Ela sabia qual
era o passo seguinte e fechou os olhos, e ele também sabia bem o rumo daquele
momento, mas estava presentes dois pensamentos que não o deixavam prosseguir. Era
a promessa que tinha feito a Luís, pai da sua amiga e também a sua relação, que
apesar de não ser séria, não deixara de ser um compromisso e ele não a iria
trair. Por isso quando Rita esperava que ele tomasse os seus beijos, Fábio
beijou-lhe a testa. A jovem sorriu e respondeu quase em sussurro:
-Desculpa. – Disse depois de baixar a cabeça e o
rapaz apenas lhe sussurrou:
-Deixa-me cuidar de ti pequenita. – Disse
pegando nela ao colo e levando-a até ao centro de saúde. Pousou-a numa cadeira
e foi ao encontro de uma administrativa e inscreveu-a para ser atendida pelo
médico. Voltou para junto da amiga. E colocou-a sobre o seu colo.
-Não tenho aqui dinheiro para pagar a consulta. Podes
pedir para mandar para casa que eu depois pago se faz favor?
-Eu pago e não há discussão possível. Não quero o
dinheiro. – Deu-lhe um beijo na testa e Fábio demonstrava cada vez mais que
queria conquistar a amizade de Rita e não conquistá-la como namorada, até mesmo
quando ela já pensara em dar um passo numa possível relação amorosa com ele. Ou
pelo menos trocado um beijo com ele.
-Obrigada e mais uma vez desculpa.
-Desculpa pelo quê? Ainda não entendi. Explica-me.
Sabes que consigo ser muito distraído quando quero. – Disse
enquanto a rapariga continuava sem conseguir olhá-los olhos nos olhos talvez
por vergonha ou medo de algo que não conseguia explicar.
-Não me digas que não percebeste o que ia acontecer. – Continuava sem olhar para ele.
-Percebi e aqui tens uma prova do que sinto por ti
Rita, porque podia simplesmente ter-me deixado levar e não o fiz.
-E eu agradeço-te porque quero que me protejas como meu
amigo e eu farei sempre o mesmo para te proteger! – Olhou para
ele. – Posso dar-te um abraço?
-Claro! – Fábio não se deixou antecipar e ele
próprio, deu um abraço á amiga e ficaram assim até chamarem a rapariga para ir
ao médico e Fábio levou-a ao colo até ao consultório e pousou-a sobre a maca e
deixou-se ficar ao seu lado.
-Então e o que é que a sua namorada tem? – Perguntou
o médico a Fábio. Rita deixou-se corar e não respondeu.
-Ela estava a andar de mota e não sei como, bateu
contra o passeio. Mas, apesar de tudo, teve sorte, conseguiu cair para o lado,
em vez de cair para a frente. Não tem força no pé e por isso não consegue
andar, e o pulso também lhe dói um bocado e tem alguns arranhões no corpo.
-Então menina Maria o que andou a fazer? – Perguntou
o médico e logo Fábio sorriu. Sabia que Maria era o primeiro nome da amiga mas
sempre se habitou a chamar Rita.
-Não me chame Maria senão se importar. Rita.
-Está certo menina. Então tente lá pousar o pé no chão
e andar só um bocadinho. – Rita sentou-se na
maca e aproveitou a presença de Fábio para pousar a mão sobre o seu braço,
servindo-a como apoio. Em primeiro lugar colocou o pé esquerdo no chão e de
seguida e vagarosamente colocou o pé direito no chão. Apertou com bastante
força o braço de Fábio e deu um pequeno passo. Seguido de outro pequeno e
depois de outro, eram curtos mas eram grandes passos para ela, que não
conseguia caminhar desde o o acidente que tivera.
-Parabéns pequenina! – Disse Fábio. – Sabe doutor são os primeiros passos desde que teve o acidente.
-Agora tente lá andar sem se segurar ao seu namorado. – Rita olhou para Fábio como se aquele olhar do amigo
lhe desse a força que ela precisava para o fazer.
O rapaz afastou-se da
jovem e encostou-se á maca e Rita devagarinho conseguiu caminhar até junto do
seu amigo e do médico. E ele não poderia estar mais orgulhoso, já tinha vencido
as suas próprias dores. Depois de mais alguns exames, o médico acabou por
informar a rapariga que tinha um pé torcido e que o melhor que tinha a fazer
era andar de muletas nos próximos dias e repousar o pé. Mas no máximo teria de
andar quatro dias com apoio das muletas.
Regressaram para as suas casas mas antes, Fábio conversou com a família da sua amiga e explicou o acidente e que tinha cuidado dela, Luís e Maria agradeceram por todo o apoio e amizade que ele demonstrara para com a sua filha. Ele despediu-se da rapariga com dois beijinhos e tentavam demonstrar que o mais importante era a amizade que os unia, mas na verdade aquele momento entre eles não lhe saíra da cabeça. Rita não queria confessar aos pais que a sua relação amorosa chegou ao fim, por isso decidiu jantar sozinha e ir deitar-se. Precisava de descansar e talvez depois de uma noite bem dormida conseguisse chegar a alguma conclusão sobre a sua vida e também, afastar da sua cabeça o momento que tivera com Fábio.
Mas Fábio, pelo contrário, decidiu que o mais acertado era pensar menos no futuro e apostar mais no presente. Em vez de regressar para casa, decidiu telefonar para a sua namorada e combinaram encontrar-se, pouco depois. Mas Fábio já não a conseguiu beijar, não lhe conseguiu tocar sequer enquanto namorada. E não se sentia tão bem ao pé de Catarina, como se sentira junto a Rita. Decidiu terminar a relação mas não lhe conseguiu ser totalmente sincero, porque sabia que a iria magoar. Explicou-lhe apenas que estava a pôr um termo á relação para evitar que ela sofresse mais futuramente. Esta era uma das razões pela qual a fizera, mas a principal chamava-se Rita.
Encontrou-se mais tarde com um amigo, João Teixeira, também seu companheiro de equipa e contou-lhe toda a história, desde o momento em que conhecera Rita. E o amigo acabou por dar-lhe alguns conselhos e dizer algo que o surpreendeu e não conseguiu mais, abandonar o pensamento de Fábio. Regressou para casa, e deixou-se adormecer. Mas sempre com aquele conselho e aquelas palavras bem presentes na cabeça.
Que
terá dito João?
E
como ficará a história do beijo entre Rita e Fábio? Será que está a nascer
algum outro sentimentos entre eles?